Em um momento em que a emergência climática exige ação imediata, a descarbonização da economia revela-se tanto um dever ambiental quanto uma grande oportunidade econômica. No Brasil, essa transição ambiental pode definir novas dinâmicas de poder geopolítico, fluxos de investimento e geração de empregos.
Contexto Global: O Imperativo da Descarbonização
O Acordo de Paris estabeleceu como meta limitar o aquecimento global a bem abaixo de 2 ºC, buscando, preferencialmente, 1,5 ºC. Para alcançar esse objetivo, é essencial zerar emissões líquidas globais por volta de 2050, com reduções significativas já até 2030–2035, conforme relatórios do IPCC e da IEA.
Na prática, isso significa a reconfiguração de sistemas de energia, transporte e indústria. A descarbonização é, portanto, uma agenda de investimentos e realocação de capital, que inclui:
- aposentadoria progressiva de ativos fósseis;
- expansão massiva de energia renovável, eficiência energética e eletrificação;
- infraestrutura verde: saneamento, manejo florestal e agricultura sustentável.
Em uma nova geopolítica do carbono, países com recursos naturais abundantes — como sol, vento e biomassa — têm o potencial de se tornar potências verdes exportando energia limpa, produtos de baixo carbono e serviços ambientais.
Brasil como Estudo de Caso: Potencial e Contradições
O Brasil já exibe uma matriz energética e elétrica mais limpa que a média global, contando com hidrelétricas, eólica, solar e biomassa (etanol e bagaço de cana). Esse cenário posiciona o país como candidato natural a líder da transição energética mundial.
- Compromissos NDC: reduzir 50% das emissões até 2030 em relação a 2005;
- Redução de 59% a 67% até 2035 e neutralidade líquida até 2050;
- Contradição: 82% dos incentivos fiscais ao setor de energia ainda vão aos combustíveis fósseis.
No entanto, apesar do potencial de liderança verde, programas como o PAC investem R$ 335 bilhões em petróleo e gás, e a Petrobras destina R$ 73 bilhões até 2028 à exploração fóssil. Essa tensão evidencia onde o dinheiro encontra (e disputa com) o meio ambiente.
Nova Economia Verde: Crescimento e Empregos
O Plano de Transformação Ecológica “Novo Brasil” estruturou seis eixos: finanças sustentáveis, adensamento tecnológico, bioeconomia, transição energética, economia circular e adaptação climática. Modelagens do Ministério da Fazenda em parceria com o Pnuma indicam:
- crescimento do PIB em média de 0,8 ponto percentual ao ano até 2035;
- até 2 milhões de empregos adicionais até 2035;
- renda per capita crescendo mais de 4 pontos percentuais até 2050.
Outro estudo do Programa de Transição Energética projeta entre 846 mil e 1 milhão de empregos verdes por ano até 2050, totalizando 22 a 28 milhões de novos empregos em 25 anos. No cenário otimizado, o PIB cresce 3% ao ano e surgem 923 mil vagas verdes anuais.
Esses números demonstram que economia de baixo carbono gera empregos em setores como energia renovável, transporte ferroviário, construção e agricultura sustentável.
Finanças Sustentáveis e Fluxos de Investimentos
Globalmente, o investimento em energia limpa atingiu US$ 1,7 trilhão em 2021. No Brasil, estima-se a necessidade de mobilizar cerca de R$ 2 trilhões até 2030 para cumprir as NDCs. Instrumentos como títulos verdes, fundos de ESG e precificação de carbono são vitais para direcionar capital.
Para isso, é urgente promover a quebra de subsídios a combustíveis fósseis e estabelecer marcos regulatórios que priorizem fontes renováveis e infraestrutura verde. A transição financeira deve ser acelerada para garantir liquidez e atratividade dos projetos sustentáveis.
Justiça Social e Inclusão na Transição
Uma descarbonização eficaz precisa ser também transição justa e inclusiva para todos. Comunidades rurais, indígenas e trabalhadores de setores fósseis devem ser apoiados com programas de capacitação e requalificação.
Investir em formação técnica, incentivar cooperativas de energia solar comunitária e assegurar consulta prévia a povos tradicionais são medidas essenciais para promover equidade e acesso a novas oportunidades.
Conclusão: Alinhando Capital e Meio Ambiente
O Brasil tem a chance de se tornar uma potência verde, aliando inovação financeira e proteção ambiental. Governos, empresas e investidores devem atuar em sinergia, redirecionando recursos para projetos de baixo carbono, garantindo crescimento econômico e justiça social.
A transição ecológica não é apenas um compromisso climático, mas uma estratégia de desenvolvimento sustentável que conecta dinheiro e meio ambiente rumo ao net zero de forma lucrativa e responsável.